terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Poeira

Passará. Mas por ora tudo o que sinto é que um furacão passou e transformou tudo em pó. Não há coração partido, ou dilacerado, ou dolorido: há poeira onde antes havia uma admiração apaixonada, um amor admirado,  um músculo pulsante, motor de minha vida... o pó se acumula no fundo de uma cavidade vazia e escurecida. Onde antes havia fé, hoje há abandono.
Uma camada grossa cobre cada canto desse quarto.
Vivo em uma casa arrasada pelo furacão, onde não existem gavetas, armários ou prateleiras. Tudo foi arrasado: as roupas jazem no chão, os copos quebrados e as promessas desfeitas. As janelas fechadas, como o coração, e cobertas de poeira e lágrimas do céu.
Meu jardim coberto por mato, sem flores, ou amores... tudo que brota é decepção.
Haverá outro amor, talvez, e enquanto giro no furacão que passa pela minha vida consigo vislumbrar dias de sorriso fácil, de sol que aquece sem arder a pele, de mobília livre de poeira.
Enquanto giro tento apenas não me perder de mim, ou me encontrar, e me amar independente de quem eu seja... afinal, não me reconheço mais nesse espiral sem lógica que virou minha vida: a vida que vivo e que parece não ser minha. De quem é?
Enquanto isso tenho lágrimas e pó, e qualquer brisa revolve a poeira do que antes era meu coração... E chovo cinza em dias quaisquer.

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Asas

 A gente cresce, e imitando a natureza tenta ser tão independente quanto o passarinho que a mãe empurra do alto da copa de uma árvore e grita, por trás de um canto doce: “voa filha da puta, se você não bater a porra dessas asinhas, engordadas com meu esforço hercúleo para te trazer insetos, vai se esborrachar lá embaixo e atrapalhar meus planos de deixar descendentes férteis.”
Sei bem que nós humanos temos demorado cada vez mais para largar o ninho, e usar as asinhas, que ficam cada vez mais gordas e impróprias para o vôo. Mas alguns de nós ainda são treinados para não espatifar no solo, e conseguir arranjar o próprio rango – na melhor das hipóteses ter seu próprio ninho, e para de piar pedindo socorro cada vez que um probleminha ocorrer.
Vivi na casa dos meus pais por três décadas, porque queria sair e voar sem medo de ter que voltar. Sei que a cama estará sempre feita, os braços abertos, o café na mesa. Mas sempre sonhei com a liberdade de voar em piruetas, não seguindo o curso reto, planejado traçado para mim. Não há nada errado com a trajetória de voo que sonharam pra mim, mas ela é diferente do que eu quero fazer. Eu quero um voo que mais pareça uma queda livre, de uma liberdade que gela o coração, dói o peito, paralisa temporariamente as asas, que voltam a bater com vigor antes da queda – estão programadas para sobreviver a qualquer custo, apesar de qualquer dor, perda ou desengano.

Quero a emoção camicaze dos voos que vão, e talvez não voltem. Por isso as conversas sobre meus rumos sejam tão difíceis. Não os tenho agora, quero voar em círculos, pousar em árvores altas e saltar, me entregar ao ar. Quero voar ao lado de aviões, drones, pipas e balões, sem pensar se me encaixo, sem pensar em quanto tempo vou ficar.
É preciso entender que eu TENTEI – voei seus voos: achei um par, fiz meu ninho, e lá tentei existir. Perdi minhas asas, meu canto, caí do ninho. A tempestade veio e disse: voa filha da puta. E eu gostei. Gostei dos imprevistos, de caçar sozinha, de fugir de gaviões, raios, gatos e da fome. Da minha trajetória sem destino, de quem apenas voa por ai, aproveitando o vento.

Tenha certeza que se precisar, eu voltarei, por mim ou por vocês, mas deixe me ir por aí, batendo minhas asas a esmo, sem torre de controle, sem regras, sem conselhos. Se a queda for irreversível, talvez quebre minhas asas, mas aprenderei, outra vez, a caminhar por aí.

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Cão Chupando Manga



O que você responderia se um desconhecedor do vernáculo lhe perguntasse o significado da expressão “um cão chupando manga”? Pessoalmente já a vi sendo utilizada para descrever pessoas de temperamento difícil: sogra, esposa, chefe, namorado, filho. Qualquer ser de difícil trato pode ser descrito dessa forma.
Acredito que cão, nessa expressão especificamente, não seja melhor amigo do homem, e sim o demônio, o diabo, lúcifer, capeta, sete pele, e tantos outros nomes: mas porque ele é descrito chupando manga me foge ao entendimento – se ao menos estivesse chupando manga com leite poderia entender… mas só manga? Acho que tamarindo se enquadraria melhor na expressão: azedo de deixar feio até o semblante de Giselle Bunchen.
Enfim, hoje eu acordei de madrugada, me sentindo o próprio capiroto que degusta um maracujá azedo, com uma raiva lascada do meu trabalho na repartição. Mas hoje também fora meu primeiro dia de férias, portanto não precisava de tanto: abstraí, repassei o fim de semana, as conversas com os 'crushes', e a conversa que eu gostaria de ter tido com o detentor da prioridade que deu para me ignorar sem saber que, assim como cachorros, eu adoro carinho e atenção, e que basta uma borboleta passar do meu lado para eu ir abanar o rabo por outras bandas se o chamego em minhas orelhas e barriga cessar.
Enfim, pensei na vida, assisti a um filme, fui ridícula nas redes sociais. Acabei caindo no sono e acordei as 7 da manhã de uma segunda-feira, com o humor de quem não precisa trabalhar, mas que vai ao escritório só para reencontrar a amiga que não via há um mês, e pegar as mangas que um colega de outro setor prometera.
Nunca fui uma pessoa muito fã de manga: via meu pai se sentar na frente da TV e consumir umas vinte de uma vez e achava aquilo pitoresco. Tínhamos um pé de manga ubá no quintal, que fazia sombra no puleiro do meu falecido galo garlinzé e na janela dos vizinhos.
Nos primeiros anos de produção quase todas as mangas foram atacadas por moscas, e portanto cheias de bicho e impróprias pro consumo: mas nosso cão Scooby as devorava. Cansado de varrer folhas, pauzinhos, florzinhas e maguinhas para que apenas o cão chupasse as mangas, meu pai, um homem engenhoso, ensacou todas as mangas antes de amadurecerem: problem solved!
As mangas no nosso quintal eram enormes gotas de mel, disfarçadas com “capas” de manga. Mas a ignorância da juventude me privava de bom gosto, e eu dava pouca atenção para as deliciosas mangas.
Só fui me apaixonar pelo fruto anos depois, quando meu teimoso pai já havia cortado nosso frondoso pé de manga porque, além de mangas, ele dava muito trabalho. Ironia a manga ubá ser a minha favorita. É como se apaixonar por alguém no momento em que ele bate a porta para nunca mais voltar: ok, estou romântica hoje, mas a paixonite nos faz fazer e dizer coisas estúpidas, mas eu prometo (tentar) me controlar.
Enfim, foi com muita alegria que ganhei na semana passada quatro mangas – UBÁ – de um colega de trabalho. Devorei-as em uma sentada, e mesmo sendo atéia, rezei em segredo para que ele me oferecesse mais. E ele o fez: prometeu levar as mangas hoje, meu primeiro dia de férias. É claro que eu não exitei em rodar 35 quilômetros para ir buscá-las e reencontrar minha amiga.
Amiga que, estando grávida e sendo apaixonada pelas danadas das manguinhas levou metade do meu presente: não quero ter bonitinho no olho, nem que a filha dela nasça com cara de manga.
Voltei para casa com carro cheiroso, louca para abocanhar uma manga e ter o sumo escorrendo em minhas mãos e boca.
Correria: aula de 1:30 as 3:30, trânsito, aula de 5:00 as 6:00, pilates, gelo, cachorros, yoga. Terminei a aula de yoga e meditei sentindo o perfume das ubás em minhas narinas.
Vim correndo para casa, o coração acalentado pela certeza de que nenhuma paixonite mal correspondida poderia superar a suculência e doçura das seis mangas que me esperavam em cima da mesa. Abri a porta, e toda a casa exalava o perfume, contudo as mangas jaziam sem casca e sem polpa no chão da cozinha e área de serviço.
Diana, prima carnal do capeta, que já havia atacado sacolas de compra e me deixado sem queijo para uma lasanha pegou minhas gotinhas de mel – todas – as devorou sem amor, sem deleite, com um apetite voraz de quem tem medo de ser pego em meio ao ato, com a 'boca na botija'.
Da doçura das mangas só restou o cheiro, e a textura açucarada no chão por onde pisei.

Assim defino a expressão: um cão chupando manga.


sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Esperança Barata

Dizem por aí que ela é a última a morrer. Às vezes acho que como fênix dá seu último suspiro para renascer logo ali na esquina. Dizem por aí que esteve presa na caixa de Pandora, aquela que possui todos os dons, e ainda sim carregou junto de si todos os males – inclusive essa biscatinha tão resistente quanto às baratas.

Nietzsche descreveu a esperança como o pior dos males, pois prolonga o suplício dos homens. Estava certo. Chego a ficar aliviada quando acho que deu seu último suspiro, e finalmente me deixará em paz, para puxar angústia, deitada em minha cama, sem ansiar por dias melhores, por amores correspondidos, por cães adotados, por carros que não parem nas rodovias, por comidas deliciosas que não engordem, por beijos que não demorem muito, por gozos que satisfaçam, por um sono que revigore.

A desgraçada vai embora, e acordo em plena sexta-feira ensolarada de um mês de janeiro com o pior mal humor do ano: noite agitada, com sonhos de uma passado recente e triste, salpicado de abandono e mágoa. Com um dia a frente que promete trabalho chato, papelada e olhadelas lascivas para a janela do sétimo andar. Vi meu ex-marido hoje. Tive a oportunidade de atropelá-lo, mas apenas suspirei.

Conversarei com uma advogada para falar de um futuro incerto, em que estarei sozinha e financeiramente quebrada: exatamente como agora. Chego a sentir as rugas entre meus olhos se aprofundando: e sinto que não haverá nem esperança, nem botox para transpô-las dessa vez. Morreu de vez – vá em paz.

Olho meu celular, depois de ter reclamado com um quase desconhecido e ele diz “Espero que melhore”. Inconscientemente eu digo “eu também”. A maldita esperança cascuda como uma barata, que estava ali, no canto da sala, com as pernas para cima, e seu interior meio para fora, depois de ter sido sapateada pela vida começa a se mexer. Porque a gente sempre espera que melhore.

A gente espera que o sorriso volte, e que amanhã as lágrimas sejam de riso. Que o vinho seja seco, mas que o beijo seja molhado e doce. A gente espera que a paixonite seja correspondida, e que ele ligue, mande mensagem, ou sinal de fumaça. A gente espera que os filhos-da-puta-do-mundo acordem e tenham esperança de que podem ser melhores, e que junto com essa esperança-barata venha também a vontade e a ação.

A gente espera que a respiração fique mais fácil, que olhar seja direto. E que a esperança fale grego, donde poderá ter vindo: e ser expectativa de dias sem males, de mares calmos, e amores mansos.

 

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

300 dias

Então ela quis morrer. A dor que sentia no peito era tão cinza que a colava na cama quando o dia nascia. Era como se sua respiração não pudesse mais mantê-la viva, como se o sangue que corresse em suas veias fosse para o mar sem antes fazer seu coração bombear.
As lágrimas eram o único movimento comum em seu corpo. Extravasavam a angústia que ela não conseguia compreender. Foram suas únicas confidentes por cerca de 300 dias, enquanto a dor a consumia por dentro, e o descaso a descascava por fora.
Então ela desejou fortemente morrer. Olhava pela janela sem ver o horizonte, via o chão que a convidava a se deitar. Atravessava a rua, e olhava sim para os dois lados, mas mais fixamente para as rodas dos veículos, que com um rápido movimento poderiam cessar os movimentos dela, que só lhe causavam dor.
Foi preciso muita coragem, e muita descrença. Foi preciso se lembrar várias vezes que a vida em si é um milagre, é uma raridade, é uma aberração, e que, portanto não se pode jogá-la fora dessa maneira.  Decidiu fazer de sua vida um “Freak Show” que devia continuar.
Foi preciso engolir o choro, e junto com ele vários comprimidos para que a sombra começasse a se dissipar. Juntamente com a sombra, foi-se embora metade de si. Justamente aquela que parecia ser a melhor. Não entendeu. De tanto almejar a queda, o chão, lá estava ela. Sozinha, como nascera. Imóvel, gelada. Quase morta.
Contudo aquele não era o fim, era apenas o ápice do roteiro. Quando toda a desgraça se aloja, e o leitor perde o fôlego. Mas ela não era a leitora.  Ela era a mocinha, a bruxa, a vilã, o cenário, o começo, o fim, a capa – seguiu ainda que sem fôlego.
Ela era tudo ao mesmo tempo que era nada. Mas não se contentou com a segunda parte. Trocou o figurino, engoliu mais alguns comprimidos, e foi lutar.
De tanto querer morrer, matou-se por dentro. Congelou o próprio coração. Proibiu-se de companhias que a roubassem de si. Tomou gosto por estar em sua própria presença. Superou o medo das janelas, do chão e das rodas. Perdeu o medo da vida, da solidão. Seguiu sozinha como disseram que iria. E gostou disso mais do que deveria.



segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Imagino

Quando vier não estarei pronta. E talvez nunca esteja. Portanto nadará em outros rios, descansará e crescerá em outro ventre.
Talvez esse ventre seja um local menos amoroso e aquecido do que eu desejo para você. Entretanto é necessário que seja assim. Seu receptáculo a rejeitará na carne, e você nascerá para esse mundo de dor. Rasgando-a ao meio, trazendo choro, sangue, agonia e só. Sua genitora a rejeitará no coração, na biologia que diz que todo pequeno deve ser cuidado, amado, nutrido até que parta para suas próprias andanças.
Mas com você não será assim. Partirá em suas andanças antes mesmo que seus olhos estejam bem abertos e veja que há mais além da dor nesse planeta redondo com tantas margens. Sinto dizer que você pousará em muitas delas.
Viverá a margem como todas nós, por ter nascido menina. Viverá a margem como tantas de nós, por ter nascido pobre. Viverá a margem como muitas meninas, por ter nascido negra. Viverá a margem como muitas crianças, por ter sido abandonada. Viverá a margem por não se enquadrar nos padrões. Mas eu te perguntarei: afinal, que peça de quebra-cabeças pode caber em todo lugar?
Contudo você receberá colo. Calor para seu corpo pequenino e frágil. Alívio para uma essência que talvez tenha sido envenenada antes mesmo de nascer. Você será alimentada, banhada, lavada e esperada. Talvez seja castigada, surrada. Queira o universo que não; desejo com lágrimas nos olhos que não; sinto uma dor no útero que não te gerará para que não: mas talvez seja abusada em sua pureza.
E por tudo isso, e várias outras dores que não consigo imaginar: eu te quererei. Porque as dores não tirarão de você a sua essência, aquela que fará com que, apesar de eu não estar pronta, você seja a peça de quebra-cabeças que faltava em mim. E nos completaremos. Ambas tortas, ambas quebradas a sua forma. E você me construirá a cada dia.
Eu já sinto muito pelas dores que não poderei evitar. Todas. A rejeição; ou rejeições. A fome do corpo e da alma. As noites sem beijo e sem história. Eu já sofro por imaginar os olhares que receberá por ser tão diferente de mim em suas formas, cores, origens. Perdoe-me, eu não pude evitar.
Eu não pude evitar seu sofrimento pregresso. E não poderei evitar o medo na primeira noite em nosso ninho; as lágrimas em seus olhinhos na primeira vez que eu pentear seus cabelos – os imagino tão enrolados quanto minhas idéias desembaraçáveis; não poderei evitar os comentários na fila do supermercado e em seu primeiro dia de aula. Talvez eu não possa evitar que você seja criada em um lar sem pai e cheio de cachorros – mas garanto que será cheio de amor.
Esse lar, que ainda existe apenas no campo das idéias, já se decora para você. E há amor nas paredes, no chão, nos copos de plástico, nos pregos que segurarão suas fotos na parede. Provavelmente não teremos fotos de seus primeiros anos, aqueles que fingimos preferir que não tivessem existido. Aqueles que trouxeram sua estrada até a minha. Que fizeram de sua estrada o caminho mais lindo que vou percorrer.
O percorrerei com coragem, apesar de não estar pronta, segurando sua mão na minha até que você não me precise mais, até que meu coração não bata mais, e que nele só reste uma tatuagem contendo seu nome.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Quebrando a cara

Eu não pretendia escrever sobre assuntos sérios. Mas comecei o ano tomando um porrada. Uma querida amiga foi agredida pelo companheiro. Difícil acreditar que  a violência ainda seja a palavra final. Feliz por ela estar viva, a história poderia ter sido bem diferente. Temerosa por ela, e por todas nós, nesse mundo cheio de "boy lixo".
Ela não quebrou a cara: quebram-lhe. Mas é claro que ela estava errada: amou demais alguém cujo vocabulário não inclui a palavra mulher. Talvez não inclua sequer a palavra "outro".
E amamos, é um grave defeito. Amamos homens deprimidos, desempregados, divorciados, acidentados, assexuados, homens quebrados - como nós - amamos por seus sorrisos, seu olhar, e com a esperança de que o amor seja a peça que falta para máquina voltar a funcionar. Erramos.
E saímos ainda mais quebradas: dentes, braços, vida.
A pergunta que faço sempre é: até quando sofreremos tanta violência?
Do vestido levantado no primeiro encontro, estupro, assassinato, abandono de mulheres grávidas, assédio sexual no ambiente de trabalho, sexualização precoce.
Os abusos são tantos que me faltam palavras.
Mas sobrevivemos. O amor é a peça que nos faz funcionar novamente: o amor próprio; o amor de nossas irmãs.
Quantas Marias, Penhas, Erikas, Saras, Fernandas precisarão se quebrar? Quantos retalhos essa
colcha maldita vai precisar? Nós nos juntamos, nos costuramos, seguimos lado a lado para que possamos novamente ser una, salvas, mas jamais as mesmas.
Amiga, ele não vai mudar. Quer dizer, ele vai mudar a mulher que você é: tentará de reduzir a pó, tenho medo que consiga. Se não conseguir, te garanto que renascerá mais forte, mas prefiro que não seja assim.
Prefiro que não endureça, não embruteça a ponto de não acreditar no amanhã.
O amanhã virá e trará consigo um abraço mais forte que a porrada  que ele desferiu. Mas lembre-se: ele não mudará, mude você de calçada quando o vir em sua direção. Mude você de atitude. Não aceite novamente menos do que você anseia. E anseie por muito.
Mude para que não precise mudar de casa, de cara, de dimensão.
#boylixonuncamais

terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Adeus 2017

Eu poderia pensar em 2017 como o ano em que perdi meu Tobias, no dia em que eu completava 33 anos, e ele 10. Contudo, vou esforçar-me para pensar nesse ano como aquele em que Melinda veio pular minhas janelas, destruir minhas calcinhas e morar em meu coração. Vou pensar em 2017 como o ano em que eu realizei o sonho (bobo) de ter um Golden Retriever, que saiu da corrente e veio destruir minhas plantas, meus vasos, minhas pernas, me deixar toda roxa com suas mordidas e me jogar no chão durante as caminhadas, e lamber minhas lágrimas toda vez que eu chorava me sentindo sozinha.
Eu posso lembrar de 2017 como o ano em que perdi meu querido Tio Luiz, mas vou tentar lembrar desse ano como o ano em que Rafael, meu sobrinho e afilhado do coração, veio morar na barriga de minha cunhada, e quem sabe não nos dê a alegria de já pesar em nossos braços.
Principalmente, eu poderia pensar em 2017 como o ano em que vi o amor, que acreditava ser eterno, se desfazer como fumaça, e me destruir... mas isso não: 2017 me trouxe a certeza de que tenho o melhor amor de todos, aquele que emana dos corações de meus grandes amigos e de minha amada família. 2017 não foi o ano que deixei de acreditar no amor, e sim quando eu o descobri em sua forma mais bonita: a mão que te levanta quando você não tem mais forças, que seca suas lágrimas e que te empurra a seguir mesmo quando, sozinho, você não quer ou não consegue.
Eu poderia pensar nesse como o ano em que fui diagnosticada com depressão, porém prefiro vê-lo com mansidão, e como o início do fim de um longo período de angústia, como o primeiro passo rumo a felicidade.
Esse foi o ano em eu comecei a fazer yoga, fui a Punta Cana, realizei o sonho antigo de ir a Machu Picchu, e o fiz sozinha, provando a mim mesma que sou forte sim.  Revi Paul McCartney, e chorei feito um bebê ouvindo Bono Vox ao vivo cantar as músicas que eu tanto amo desde sempre.
Estreitei laços, desfiz alguns que me seguravam, e me faziam infeliz, e construí novas pontes.
Conheci muita gente legal, experimentei novos sabores, permiti-me sofrer, enlouquecer e perder-me para assim encontrar-me.
2017 foi o ano em que quebrei financeiramente, mas foi o ano que me ensinou que dinheiro não é tudo, apesar de ser muito importante sim.
Quem tem bons amigos e familiares tem sempre boas razões pra sorrir, bons lugares pra ir, e quem sabe um cerveja gelada, apesar da pobreza.

Eu aprendi que chorar é importante, e que não dá pra fugir do sofrimento e fingir que nada está acontecendo, mas que apesar das amarguras, a doçura volta, o sorriso aparece quando a gente menos espera.

Desejo que esse ano chegue logo ao fim: para mim ele foi como uma disciplina na área de exatas, em que eu não entendia bem o que estava acontecendo, mas que mesmo assim, me ensinou muito, e que apesar das dificuldades e com uma "colinha" daqueles que se importam, eu consegui passar.

Não o verei com muitas saudades, entretanto lembrarei dele com gratidão por ter me permitido aprender e viver tanto.

segunda-feira, 1 de janeiro de 2018

Cachorra (não) amarela pulou a janela.

  • Quem tem cachorro, principalmente os do tipo selvagem, sabe que os dias são tão cheios de novidades quanto nossas roupas cheias de pêlos. 
    Pessoalmente venho acumulando histórias que, depois dos desfeixos, acho engraçadíssimas. Morando, sem nenhuma companhia de duas patas, com cinco cães tão descompensados quanto eu, não poderia ser diferente mesmo.
    São cercas destruídas, animais de pequeno porte assassinados,  brigas... muitas brigas, caminhas explosivas que fazem nevar em meu gramado - que é mais um matagal que um gramado, plantas destruídas quase que no instante em que são plantadas, orelhas partidas, mordidas no seio, cachorro pulando em vala e me 
    dando 'olé' no meio da rua depois de ter fugido pelo meio de minhas pernas.
    Essas são algumas das façanhas que minha cabeça ressaqueada e com sono consegue lembrar hoje, Primeiro de janeiro de 2018, após apenas 3 horas de sono.
    Dos meus cinco cães a garota problema é definitivamente Diana, um bicho estranho, gorda, com uma cabeça pequena, pernas tortas e dentes que nunca cresceram. A cabeça pequena faz com que ela não pense direito, e falta dos dentes não faz falta nenhuma: ela morde cachorro, principalmente se for fêmea, gente, também tem predileção pelo mesmo gênero, o que não a impede de experimentar outros sabores. 
    Enfim, depois de várias tentativas de assassinato precisei separá-la de Maggie, uma estopa terrier de quase oito anos e Melinda, uma border collie rebaixada que tem vento da cabeça e nas patinhas. 
    Assim, ontem ao sair de casa, para enterrar 2017, deixei Diana dentro de casa, com acesso á area de serviço e a cozinha. E Maggie, que tem pavor de fogos, ficou bem escondida e segura em um dos banheiros do segundo andar.
    Melinda, um guaxinim diabólico, ficou lá fora. Ela e Boris, um Golden Retriever legítimo, competem no quesito quem me esquenta mais a cabeça: ela é um gênio do mal, ele um retardado musculoso, um rolo compressor desmiolado.
    Voltando a divisão da cachorrada na virada do ano: Maggie no banheiro; Diana na área de serviço e cozinha; Melinda, Boris e Doritos o chefe da matilha, no quintal.
    Saí, bebi, me esqueci da vida, dormi. Acordei três horas depois lembrando dos demônios a quem chamo de cachorros, e que precisavam ser alimentados.
    Dirigi até minha casa, imaginando os cães soltos pelo condomínio, a cerca no chão. Maggie desmaiada no banheiro, após perder várias unhas tentando abrir a porta. 
    Felicidade define meu coração ao descer a rua e ver a cerca intacta. 
    Preocupação define a sensação de abrir a porta e não ver Diana me esperando na área de serviço como ela sempre faz. Os baldes estão caídos, há certamente algo errado. Eu a chamo, e ela não vem. Será que morreu por causa dos fogos?
    Alguns passos e estou na cozinha, nada. De repente ela vem da sala, para onde ela se deu acesso, e assim a todo o resto da casa, derrubando a cerca.  
    Assim que me vê, vem saudar-me agarrando-se as minhas pernas com suas garras. E de repente, logo atrás dela, viva, sem nenhuma mordida, Melinda - a quem decidi chamar de Meliante. 
    O guaxinim subiu na pia que fica do lado externo da casa, o que ela fazia antes com o auxílio das  casinhas que ela empurrava pra fazer de escada, e mais recentemente com saltos ornamentais. Abriu a janela que estava destrancada, e veio tentar cometer suicídio ao dividir a casa, livre, com a homicida sem cabeça. 
    Para minha surpresa Melinda, ops Meliante (é força do hábito) estava inteira, e também meu sofá, minhas almofadas, minhas cortinas e tapetes. Não havia cocô, nem lixo espalhados. 
    Apenas marcas de patinhas e pêlos. 
    Parece que 2018 será um ano de paz, e de janelas bem trancadas, protegidas de meliantes de quatro patas.

  • Melinda Meliante. Imagine se tivesse pernas longas.


cura

Disseram-me que eu me curaria. Mas como me curar da própria vida, da própria história, daquilo que indiscutivelmente desenhou linhas em meu ...