sexta-feira, 22 de março de 2019

Uma Nubia que chove

Hoje eu chovi. Parada no trânsito de uma sexta-feira molhada, enquanto as nuvens, tão EU em essência, choravam lá fora, eu derramei um pingo de chuva, que escorreu sorrateiro, trilhando os rasos vincos do meu rosto.

A chuva, e o choro de minhas irmãs NUBLADAS eram a anunciação de um novo tempo. Alerto que nem tudo que é novo é bom, mas admirar páginas novinhas em folha para semear palavras; ou um campo arado esperando a germinação é, para mim, particularmente inebriante.

Então, sem tentar conter a precipitação daquela lágrima, eu chovi amor. Um amor de gratidão por tudo que já vivi e amei, caminhos tortuosos que me trouxeram exatamente aqui, esse lugar onde não sei, onde não planejei, que não estava no mapa – nem no que tracei, nem no astral – nem nas instruções que me deram pelo trajeto. É AQUI, onde estou agora, a sombra de uma árvore, cansada – eu e a antiga e sábia árvore, ambas contemplativas, ambas esperançosas a admirar a mudança das estações, e as metamorfoses que, o simples passar do tempo, operam na gente. Claro que existem outros agentes, intempéries, gritos da natureza, e lenhadores que em sua rudeza nos moldam, nos quebram. Apenas nossos galhos, porque nossas raízes tão velhas, profundas, e firmes carregam nossa densa seiva essencial.

Enfraquecemos, parecemos mortas DIANTE DE TANTA VILANIA. CONTUDO, TÃO LOGO SOMOS deixadas para trás, a chuva nos lava, e leva tudo o que precisa, tudo o que sobra, tudo que não nos é essencial. E com o adubo daquilo que nos foi tirado, E DO QUE FOMOS UM DIA podemos brotar novamente – com nossas folhas, nossos aromas, novos frutos, novas sementes – costumeiramente mais fortes e frondosas apesar das marcas deixadas em nossa casca. AMO AS SEMENTES, QUE PODEM ALCANÇAR DIVERSOS SOLOS E FLORESCER EM TODO LUGAR EM QUE HÁ SOLO, CHUVA E UMA BRECHA. A semente é a afronta.

Olhei para dentro de mim, enquanto eu chovia e pensei que chovia de alegria, e que alegria, essa sim é minha essência. Portanto esse estado deve ser meu destino, e mais ainda, minha estrada. ONDE PODERIA ENFIM FLORESCER LIVREMENTE. Indaguei-me, então como fazer para estar lá.

Pensei em todas as rotas que me foram ensinadas ao longo da vida, e que, infelizmente, a maioria das pessoas que me serviam de norte, ou tentavam ser uma bússola, desconheciam o lugar ONDE EU DESEJO ESTAR: então vi, pela primeira vez, com a clareza de uma ensolarada manhã de verão, o significado real minha busca cotidiana – antes de concluir minha jornada quero viver na alegria, não apenas sobreviver . ANTES DE PARTIR QUERO experimentar A VIDA E CADA UM DE SEUS SABORES, SE NÃO TODOS, AO MENOS TODOS OS QUE TIVER A CHANCE; conhecer, RECONHECER, ME REIVENTAR QUANTAS VEZES FOR NECESSÁRIO.

Antes que a festa acabe, e ela vai acabar, quero experimentar todos os pratos; todos os drinks; ter-me com cada um dos convidados, conversar, rir e aprender com eles. Quero poder abraçar cada uma das pessoas que desfruta essa festa comigo, se possível demoradamente, e agradecê-los por terem vindo. Quero dançar ao som de todos os ritmos. Quero conhecer novas canções, novos artistas. Quero estar em cada um dos ambientes desse lindo e complexo evento que é a vida.

QUERO VIVER ESSA FESTA SEM ESTAR ENTORPECIDA, ANESTESIADA. QUERO DELEITAR-ME NESSA FARRA RODEADA POR PESSOAS DE BEM, COM QUEM EU POSSA DEIXAR MEU CORAÇÃO BATUCAR EM HARMONIA, UM SAMBA DE RODA – A RODA DA VIDA.

Olhei para mim, e vi minha inquietude, E ELA ME AQUIETOU – e a chuva trouxe um arco-iris, invertido, em forma de sorriso. Numa manhã chuvosa de sexta-feira eu me reencontrei. E me amei apaixonadamente, com a ânsia que apenas uma criança sedenta por descobertas pode ter. Eu quero viver tudo o que pode me edificar: quero aprender novos idiomas; e me comunicar com novas culturas; e conhecer novas pátrias e novos pares. Experimentar novos estados, e dar nova oportunidade aos velhos sentidos.  QUERO BEBER DESSA ÁGUA CORRENTE, E CORRER COM ELA, E SER ELA – OCUPANDO TUDO QUE POSSO, CADA ESPAÇO, MATANDO CADA SEDE, GERMINANDO CADA SEMENTE. DESAGUAR NO MAR QUE É SE AMAR.

domingo, 17 de março de 2019

A casa é sua

'Não repare a bagunça', dizem.
Reparo sim, pois é a roupa fora do lugar, as compras para guardar e pêlos de cachorro em todo lugar que dizem que uma casa é também um lar.

Às vezes me deixo recados na poeira da mobília, lembretes de que o amor é sempre o melhor abrigo, o melhor abraço.

cura

Disseram-me que eu me curaria. Mas como me curar da própria vida, da própria história, daquilo que indiscutivelmente desenhou linhas em meu ...