Um pedaço de mim morreu. Era bonito, caloroso, sonoro. Era aventureiro, destemido, feliz. Era a parte tingida de vermelho dentro de mim. Parecia um pedaço pequeno, até mesmo para olhos bem treinados. E vazia, parecia leve – segui.
O vazio
deixado por aquela pequena morte foi aos poucos sendo ocupado, canto abandonado
no jardim, tomado por toda sorte de mato selvagem depois do primeiro dia de
chuva fraca. A chuva, que poderia ter sido refresco para terrenos quentes, foi
alimento pro mato que queria nascer, e tendo espaço e solo fértil germinou,
brotou, tomou conta de tudo.
Como
labareda que outrora ocupara aquele lugar, o mato tomou conta de tudo, com
violência, cegueira, e dor. Impiedoso ocupou não apenas o espaço deixado pelo
pedaço que sucumbiu, cobriu tudo. Ali, não havia mais flor, vida, verde, ar,
não havia mais sol, só havia o mato desordenado, sufocante, onde nem a mais
leve das borboletas poderia sobreviver.
Apenas mato
seco, e a vida rasteira e venenosa; e o medo da secura rachada, e da vida - rasteira
e venenosa; e de uma nova morte. O coração batia dilacerado, o ar chegava
incendiado aos pulmões, o corpo tremia. Era instinto de fuga, porque nova morte
é certa.
Agora vivo com
medo, qual pedaço de mim me abandonará? O recém-nascido oco e infértil de quem
quero me livrar, e que precisa morrer? Por vezes um sussurro diz que apenas matando o todo, poderei matar o oco. Há nesse
momento um nada sombrio que toma conta de tudo que era alegria. É como se sorriso
fosse palavra que não existe no dicionário.
A pergunta
não cala, jamais, está em cada batida doída em meu peito pesado: qual pedaço de
mim se despedaçará? Qual dos quatro cantos no meu mundo?
Uma pequena
morte, um pequeno vazio. Um fósforo incendiário no seco mês de setembro, quando
o chão se abre sobre nossos pés – um pouco de cada vez, e nos engole inteiros,
sem promessa de devolução.