quinta-feira, 12 de julho de 2018

A fila anda, mas a roda...


A fila anda, e não há nada de errado com isso. Mas essa expressão soa-me formal demais. Filas remetem a esperas, que nem sempre são compensadoras: fila aguardando um atendimento médico que pode nunca chegar. Filas esperando um serviço público que, se for prestado, é feito na maioria das vezes com muita má vontade.

Filas de banheiros químicos imundos no carnaval. Filas de carro para passar no pedágio. Filas de emprego, cheias de pessoas desesperadas que muitas vezes aceitam qualquer coisa. Às vezes estamos na fila e nem sabemos se é a fila certa, não vislumbramos o que está lá na frente. Fila exige paciência. Fila carrega a idéia de que uma ordem deve ser obedecida, ou o barraco está armado, mesmo se a vez for do prioritário.

Enfim, fila é chato – tanto para quem aguarda, quanto para quem está do outro lado: seja o bancário, o atendente do pedágio, o banheiro químico, ou a pessoa que recolhe seu ingresso no show do Roger Waters. Claro que a espera pode compensar, mas a gente não precisa se organizar em filas.

Portanto proponho a idéia de Roda de Capoeira. A roda não anda, ela gira, como os planetas em torno no sol, como a moça que dança sozinha na sala de estar. A Távola do rei Arthur era redonda. A roda não tem fim. E como já dizia Chico Buarque “Roda mundo, roda-gigante. Roda moinho, roda pião. O tempo rodou num instante, nas voltas do meu coração.” Rodas são muito mais legais.

A gente brinca de roda desde criança. Há rodas de viola, de samba, roda do vestido da mulata, roda de liga leve. Quando uma idéia é brilhante a comparamos a ‘invenção da roda’. Mas a roda de capoeira é muito mais legal.  A capoeira é a cara de nossa cultura, e tem como elementos respeito, malícia, responsabilidade, provocação, liberdade, desafio, brincadeira, energia, ancestralidade e muito mais.

“A roda é um palco metafórico da vida dos capoeiristas” (http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/tecap/article/view/10180/7953) – bonito isso, né? E a  roda meio que dá equidade aos participantes. Tem música, movimento, berimbau, dreads, homem e mulher...

Portanto, não falemos mais de filas quando pensarmos em nossa vida afetiva – a não ser que a sua seja chata assim. Na sua roda você pode colocar quantos participantes quiser, excluir algum se ele não estiver se comportando em concordância com seu grupo. Pode chamar para a ginga quem você quiser, na hora que quiser e pode repetir. Se o jogo com não estiver legal, olhe em torno e chame outro, ou outra para o centro da roda com você – ela é sua roda. Escute a música dos berimbaus, das palmas e dos tambores e pulse com eles. Respeite seu corpo, e seus limites.

E se quiser, não chame ninguém para o centro. Esse espaço é seu, é a sua roda de capoeira. É a roda de sua vida, faça-a girar em seu ritmo, em torno de si, mas sem perder, jamais, o respeito por quem a está dividindo com você.

Ps. Se você chama o boy da roda pro centro e ele fica fazendo joguinho, não se estresse, e gingue com outro!

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