domingo, 18 de fevereiro de 2018

13 reasons why (not).

Tá bom, eu assumo: estou viciada no canal da Youtuber Júlia, o Jout Jout Prazer. Assisto durante horas, um vídeo atrás do outro, e quando vejo o choro compulsivo na companhia da garrafa de vinho já virou risada, e juro que não é efeito do vinho, porque tenho reações similares mesmo estando sóbria.
Um dos primeiros vídeos que assisti fala sobre fim de relacionamento, e não foi coincidência: assim que meu ex-marido saiu de casa uma amiga/ aluna (valeu Fafá) me mandou, talvez porque eu tenha reagido ao fim do casamento melhor que a maioria das pessoas reage: não fiquei insistindo para ele voltar; não fiz chantagem; fui viajar e deixei ele levar de casa tudo que fosse dele – sem fiscalização (o que culminou com ele lavando mais do que deveria); estou aceitando dividir tudo no meio apesar do dano emocional que ele me causou e sigo vivendo – apesar da desilusão e da depressão que eu havia começado a tratar dias antes da surpresa: “não te amo mais, e não quero mais estar casado: quero o divórcio'.
Nesse vídeo ela fala sobre a música Sonhos do Peninha, que transcrevo aqui:

Tudo era apenas uma brincadeira
E foi crescendo, crescendo, me absorvendo
E de repente eu me vi assim: completamente seu
Vi a minha força amarrada no seu passo
Vi que sem você não tem caminho, eu não me acho
Vi um grande amor gritar dentro de mim
Como eu sonhei um dia
Quando o meu mundo era mais mundo
E todo mundo admitia
Uma mudança muito estranha
Mais pureza, mais carinho
Mais calma, mais alegria
No meu jeito de me dar
Quando a canção se fez mais forte, mais sentida
Quando a poesia fez folia em minha vida
Você veio me contar dessa paixão inesperada
Por outra pessoa
Mas não tem revolta não
Eu só quero que você se encontre
Ter saudade até que é bom
É melhor que caminhar vazio
A esperança é um dom que eu tenho em mim
(Eu tenho sim)
Não tem desespero, não
Você me ensinou milhões de coisas
Tem um sonho em minhas mãos
Amanhã será um novo dia
Certamente eu vou ser mais feliz




A análise é toda ótima (link: https://www.youtube.com/watch?v=cZTv0bUCKKI), mas tem uma parte que me identifico muito: não tem desespero, não. Você me ensinou milhões de coisas.
Cara, isso é muito verdade. Nosso relacionamento terminou de forma muito abrupta e cruel, para dizer o mínimo, mas ele me ensinou muita coisa: contas de porcentagem; a fazer molho branco; andar de bicicleta; regra de três; o nome de um monte de árvore… muita coisa, sem sarcasmo ou ironia, mas a mais importante delas foi o 'por que não?'.
Toda vez que eu estava diante de um novo desafio, e em pânico, afinal sou uma pessoal intensa em tudo, principalmente na ansiedade, ele me perguntava simplesmente: por que não? Foi assim quando fiz concurso; quando participei e passei no processo seletivo de melhor escola de inglês da minha cidade; quando tive a oportunidade de dar aulas de português para dois garotos americanos, filhos de linguistas; quando compramos o lote e decidimos construir; etc. Ele me ensinou a ser mais ousada – criou um monstro – intenso no 'por que não?'.
E por que estou contando tudo isso? Porque quero falar da série '13 reasons why' que narra a trajetória de uma adolescente que comete suicídio. A série é em flashback, e Hanna nos conta em fitas cassete as treze razões que a levaram a cometer suicídio.
Ainda, o que isso tem a ver com essa pessoinha que vos escreve? Estou deprimida, em tratamento há cerca de seis meses. Procurei um médico por que sentia uma tristeza tão grande que pensamentos suicidas começaram a transbordar de minha cabeça. Queria, planejava e chegava a um passo: de me jogar da janela do sétimo andar, ou em frente a um ônibus articulado no centro da cidade. O pensamento me estrangulava, e por vezes eu achava que não iria resistir. Com a medicação, e com a loucura que minha vida se transformou depois da separação (sem grana, sem tempo, sem equilíbrio, sem mim), a necessidade de sobrevivência venceu o desejo de apertar o botão de 'off'. Mas esses dias a bruxa voltou a me rondar.
Não sei pontuar quando, ou como ela entrou novamente em minhas ideias, mas ela está aqui, e por isso resolvi relatar os 'porquê não' do meu suicídio, mas não porque eu queira de fato fazer: em um surto eu queria tanto me matar, mas tinha ao mesmo tempo tanto medo, que escondi todas as facas da minha casa. Ou seja, na maioria da vezes eu faço minhas loucurinhas porque são apenas isso, loucurinhas, não há de fato razões para não ir adiante. Mas e seu me matar?
- Razão 01 para eu continuar viva: eu sou cética. Não acredito em reincarnação; em céu, e nem em inferno, onde todos os meus ídolos musicais estariam. Tive a sorte de ser um espermatozoide esperto que não foi recrutado para uma mera punheta; mamãe estava num dia fértil, e tanto papai quanto mamãe (será que fui feita assim ou em alguma posiçao do Kamasutra?) fizeram a conta errada da tabelinha: portanto EU SOU UM MILAGRE BIOLÓGICO – tantos outros não foram, e eu estou aqui, saudável, visualmente palatável, intelectualmente acima da média. Com essas características tenho grandes chances de virar o jogo, e voltar a ser feliz, e pode ser que isso já aconteça amanhã. E se eu morrer nem vou ficar sabendo.
- Razão 02 para eu continuar viva: sou orgulhosa, e não quero ninguém falando que eu não fui capaz. Tá uma merda sim, mas eu vou conseguir: como consegui passar no vestibular mesmo tendo estudado em escolas públicas; como consegui pegar 95% dos caras que eu quis, mesmo sendo gordinha; como eu consegui passar em um concurso público mesmo trabalhando de segunda a sábado; como eu consegui emagrecer, e engordar tudo de novo, no vigilantes do peso. Até agora eu venci 100% dos riscos de morte que a vida me propôs, e muitos dos outros que eu escolhi – não vou deixar que falem de mim.
- Razão 03 para eu continuar viva: eu ainda estou tecnicamente casada. Isso quer dizer que se eu morrer hoje todos os meus bens, e meu seguro de vida irão pro cara que cagou na minha sanidade. Imagine que presentão? Não vou dar, não. Desculpe aí, mas “eu até quero que ele se encontre”, mas 'tem revolta sim'.
- Razão 04 para eu continuar viva: minha filha. Teoricamente ela ainda não existe, mas se é para deixar meus bens materiais para alguém, que seja para ela – descrita com todo amor em um dos meus textos anteriores. Quero adotar uma menina e ajudá-la a ser um mulherão da porra! Tanto com bens materiais quanto com o amor que trago nesse coraçãozinho de pó.
- Razão 05 para eu continuar viva: os caras do meu planeta podem voltar a qualquer momento, e me levar de volta para casa, onde eu não vou me sentir tão errada, tão deslocada.
- Razão 06 para eu não cometer suicídio: não gosto de dar trabalho. Daí fico pensando na galera recolhendo meus pedaços embaixo do busão; ou da minha massa encefálica espalhada depois que eu tiver batido no solo, e a geral vomitando… fora os trâmites de reconhecimento de corpo, velório e tal.
- Razão 07 para eu não cometer suicídio: pense na decepção da minha mãe! Até pouco tempo ela não sabia que eu já tinha fumado. Da filha mocinha, que … tá bom, nunca fui princesa, mas também nunca dei trabalho, para um corpo no IML? Eu sei que ela adora falar de mim para as amigas, se gabando de todas as minhas 'conquistas'… certamente ter coragem para tomar um punhado de pílulas não seria uma delas.
- Razão 08 para eu não por fim a essa merda: tenho um monte de livro para ler e série para assistir, isso só computando o que já foi lançado, imagine o que tem por vir?
- Razão 09 para eu continuar insitindo nessa porra: eu realmente gosto de fazer raiva em algumas pessoas, e privá-las da minha presença seria um favor para elas. Vou ficar aqui, deprimida e com minha cara inchada de tanto chorar só para assombrar, irritar, e vê-las reclamando.
- Razão 10 para seguir a luta: amo causas impossíveis tipo salvar cachorro de rua. Se eu morrer não sei o que será feito dos meus peludos, além disso alguns outros poderão não ser salvos. Na verdade essa é uma das primeiras razões, mas como estou com sono a ordem está meio atrapalhada.
- Razão 11 para adiar a vinda da foiçuda: se eu cometer suicídio tudo acaba, de uma vez. Para quê fazer isso de forma agonizante se posso beber, fumar, me entupir de comida e outras cositas mais? Sei que sou ansiosa, mas gosto muito de comer e beber.
- Razão 12 para não me matar: meus amigos não ficariam satisfeitos, e eu tenho uma necessidade ridícula de tentar agradar as pessoas. Essa é uma das razões da minha depressão, eu acho. Procuro aceitação da galera, do meu pai, dos meus amigos, do boy magia…
- Razão 13 para seguir lutando: amanhã pode ser diferente. Estou tralhando para isso. Ganhei um violão e quero aprender a tocar para voltar a cantar. Quero tirar carteira de moto. Quero fazer sexo de novo, e de novo, e de novo. Quero segurar meus sobrinhos nos braços. Quero chorar novamente, de tanto rir. A verdade é que o desespero é maior, porém mais fraco que minha vontade, que minha alegria. Sei que ela está aqui, em algum lugar. Eu não a vejo mais, mas meus amigos continuam insistindo que essa alegria sou eu.

Meus amigos e minha mãe enxergam em mim alguém que quero ser. Enxergam alguém que talvez eu seja, mas que minha miopia psicológica me impeça de ver: para eles eu sou forte, bonita, alegre, solidária, sincera. Talvez eu seja tudo isso, e apenas esteja me olhando pelas lentes erradas, por isso prefiro insistir um pouco mais, e depois mais um pouco – até eu conseguir.


Um comentário:

  1. 🎶viver e não ter a vergonha de ser feliz... Cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz 🎶

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