Há dias em que não abre as janelas. Teme que lhe fujam as últimas forças; assusta-lhe a possibilidade que pule o corpo, mal conduzido por sua mente pérfida. Não as abre por medo de tocar-lhe o sol, espantar de sua pele o cheiro da tristeza, da mágoa mofada que carregou consigo durante as últimas semanas.
Há dias em que não cobre o rosto com pó e carmim. Receia que vejam a casca, e não seu interior profundo e quebrado, e colado. Colado tantas vezes que já não lhe sobram partes inteiras, é tudo junta, é tudo encontro, é tudo um pó metamorfo que, apesar de pó, inunda lhe as frestas – mas lembrem-se, não lhe cobre as rugas, nem as manchas.
Há dias que ela se entrega a cama, não porque não tenha mais forças – apenas por estar cansada. Fatigada de viver em sua pele, tão mal tratada, mal amada; excessivamente desejada – por motivos epiteliais, tão diferentes daqueles que carrega em suas tatuagens. Ela, que tanto ama, inclusive a si, não aceita que sua pele seja maior que sua alma, e que a julguem por isso. O presente é o que vem dentro do pacote, e para isso é preciso entrega, é preciso rasgar os papéis bonitos – é preciso receber.
Nesses dias, tudo fecha. Ela se vê nublada, trovoada, precipitação.
Há dias ela está assim, mas nesses dias ela é tempestade que não se segura, e passa avassaladora sem pedir licença, sem pedir desculpas – sem sentir essa culpa que tentam imprimir a ela. Nesses dias, ela se fecha, olha para dentro, para sua dor, e vê que aquele cisco que tanto a machuca já parece pérola, e será pérola – apesar de hoje apenas doer.
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