A vida é como um problema matemático do segundo ano do ensino fundamental: se Maria tem 33.945 dias para viver, e já usou 10.950, com quantos dias ela ficou para, ainda, aproveitar?
Cada dia sobrevivido é uma dia a menos de novas possibilidades. Não tem retorno, reuso, ou reciclagem. Foi. A vida é terminal, como uma doença incurável grave - podemos até não ter uma morte anunciada para o próximo quadrimestre, mas ela certamente está mais próxima hoje do que na semana passada.
Não sou Maria, não sei quantos dias tenho, e pouco me importa quantos já usei - afinal eu joguei fora alguns dias inteiros, sem saber o que fazia; às vezes a gente acha que vai gastar umas 8 horas, mas depois de cinco minutos, mal gastos, a gente volta pra casa - vai gastar semanas pensando no que aconteceu. Enfim, o que está feito, é irreparável, mas não quero, e não vou, desperdiçar os momento que me restam de minha vida terminal.
E foi assim, com essa certeza, que comecei a sorrir em plena segunda-feira; a trabalhar mais com o que amo, e a gostar do meu emprego. Aprendi a gastar meu tempo, e sua gêmea promíscua - o dinheiro (isso mesmo, sem gênero definido) - apenas com prazeres aparentemente garantidos: comida boa, preparada por mim, com ingredientes escolhidos para agradar meu paladar, meus valores morais, e meu senso político; vinho seco e bom; cerveja puro malte; cachorros fedidos, vadios e semi selvagens. Viagens.
Uso meu tempo para aprender, ler, me informar. Para cuidar do meu próprio corpo, sem demandá-lo demais. E principalmente, aprendi a escolher bem com quem dividir as maçãs, os chocolates, os dias, as risadas e a cama.
Maria, a problemática da matemática infantil, não dá seus pertences assim, para qualquer um. Nem eu. Melhores amigas não falham nunca, com elas os problemas matemáticos desaparecem e os minutos parecem se multiplicar. A gente soma comida, vinho, vídeo besta da internet, divide, copo, cigarro e até os boy (alguns). No rolê, cada uma leva um pratinho, e quando vê, já virou festa - com direito a dançar descalças na cozinha, e o que mais tivermos vontade.
E o que dizer sobre pessoa que habita minha pele? Só me leva pra onde eu quero ir; me dá os melhores presentes; faz sempre os melhores pratos vegetarianos, sem perguntar 'nem peixe?'. Sabe que gosto de dormir em diferentes lados da cama, e nunca me critica por isso, mesmo quanto estou com os pés na cabeceira, e a cabeça em um ângulo oposto aos pés. Ela me compra blusinhas; me dá consolo, carinho, lanches e vinho quando preciso, e sabe permanecer em completo silêncio quando é necessário.
Estou gastando os dias que tenho de forma a não ter que responder ao problema matemático, afinal gosto é da poesia que se gruda nas letras da canção. Gosto é de gozo, e para que ele exista preciso ocupar minha mente com prazeres reais. É claro que ainda quebro a cara: vou a baladas que não me abalam; dou moral a gente que mente (mas afinal, como saber?). Contudo, já diziam nossas avós, não se pode fazer um omelete sem quebrar os ovos. Quebro-os, uso-os. Choco-os, os atiro contra 'pessoas' como forma de protesto - mas só quando quando a conta fecha.
Eu não perco tempo fazendo planos: realizo. Eu não preciso traçar metas, a tenho clara: viver antes de morrer. Por isso, não tome de Maria, de Nubia, de João ou de Tereza seus caros dias. Chegue na hora, venha ligeiro, e parta tão logo sentir vontade. A vida não espera, ela toma, impiedosa.
Vem somar seu riso com o meu, sua piada ruim ao meu repertório, vem descobrir que no fim das contas quem soma, multiplica, e que quem divide com quem é do bem, se espalha e espalha amor. E esse amor, mesmo quando Maria não tiver mais dias, permanecerá, investido, lucrativo, saudoso, por todos os lados onde ela se repartiu.
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