domingo, 30 de dezembro de 2018

Carta àquele que não me foi permitido amar

Estar doente. A doença não nos define, ou não deveria nos definir. Não somos o câncer, a diabetes e o lúpus. Eles nos limitam às vezes, fazem com que atividades simples se transformem em uma luta.

Para cada doença, e para cada indivíduo, um tratamento diferente. É preciso tentar um método, se não estiver funcionando, é importante que novos tratamentos sejam testados. Sem abandonar aqueles que estão funcionando. Para diabéticos, por exemplo, é importante que haja controle da alimentação, medicação, tudo precisa ser controlado. Pessoas com câncer, por vezes, precisam de quimioterapia, radioterapia, cirurgia.

Nem sempre o paciente quer passar por isso. Às vezes dói. Às vezes é desconfortável. Mas faz parte do processo. Se optam por desistir do tratamento, a chance de recuperação depende de milagres... Nos quais eu não acredito.

Estar doente é aprender a lidar com as mazelas que a enfermidade traz, e com o tratamento, que nem sempre é rápido, eficiente, e agradável. É preciso ter coragem, é preciso ser forte. É preciso não se perder para a doença, e nem perder o bom humor. Ela precisa de você para existir, e não o contrário.

O fato de não controlar os sintomas pesa às vezes, é aí que precisamos de ajuda. De uma mão pra segurar a nossa. De um abraço. É isso que nos guia rumo a luz no fim do túnel. Mas se não seguramos essa mão, e vendamos nossos olhos para essa luz, esperança de dias melhores, estamos condenados a perecer.

Devemos ser tratados, mas principalmente, devemos nos tratar. Evitar comidas que nos aumente a glicose; a fumaça que nos enegrece os pulmões; pensamentos que nos pesam o coração.

Depressão é uma doença: tem tratamento, tem qualidade de vida, tem até felicidade. É possível ser feliz mesmo estando doente. Basta que a gente se permita, que a gente teste tudo, até aprender o que funciona. O aprendizado não virá te encontrar dentro de seu quarto. É preciso ir até ele, e deixar ele percorrer suas veias. Seja insulina, doxorrubicina ou serotonina.

Às vezes nos viciamos no tratamento. Aconteceu comigo, hoje busco dopamina, serotonina, ocitocina e alguns outros em qualquer lugar.

Quando tinha uns oito anos, li uma placa que dizia é loucura fazer sempre o mesmo, esperando resultados diferentes. Se quer ser diferente, é preciso mudar seus atos, pouco a pouco, e assim vá se refazendo.

Se você tem uma doença crônica, ela não irá embora, mas ela estará sob seu controle. Volto a repetir, você não é sua doença; é ela quem precisa de você para existir, e não o inverso. Dá pra deixar uma depressão tão pequena quanto uma pulga - que vai te picar às vezes, e te fazer coçar. Mas dá para ser feliz apesar disso. O que não dá é para deixar que ela seja sua bússola, um mamute sentado em seus ombros, determinando qual caminho você tem que seguir.

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(Eu gosto de você, mas meus métodos para tentar te ajudar parecem ineficientes. Na verdade, minha presença parece desencadear em você sintomas indesejáveis. Manter-me ao seu lado não te ajudou. Eu tentei. Você me afugentou outras vezes, e eu insisti em ficar.

Resolvi te ouvir. Quero te ver bem, só então poderei te ter bem. Eu estou tentando fazer algo diferente, para que você possa ter um resultado diferente... Um resultado melhor, é minha esperança.

Sei que sua melhora não depende de mim, mas não quero ser o açúcar que te cega, te despedaça. Se não sou parte da sua solução, sinto-me parte do problema: e esse fardo é pesado, e não consigo carregar. Portanto, minha mão tá perto da sua, meu ombro tá do lado do seu: mas depende de você alcançar e se abrir a novas possibilidades, tratamentos alternativos, eu não serei a medicina tradicional na sua vida.

Eu sou a festa, a dança, e o riso. Eu sou a piada sobre coisa séria; eu sou o desafio. A escada para te ajudar a chegar do outro lado, mas a subida é toda sua.)

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