segunda-feira, 11 de junho de 2018

Cérebro e dentes

Todas as vezes que me apaixonei, caí por duas características muito marcantes: um sorriso bonito e um cérebro pulsante. Quase sempre que me apaixonei deu certo, pelo menos durante um tempo, até que o sorriso me cegava de amor, e o cérebro me manipulava – e eu me deixava envolver como um inseto preso em uma teia.                 Que perigo eu corro - vejo essa combinação e digo logo: olhe ali uma tentação, me solte que quero cair. E caio com gosto, de cabeça, quebrando a cara, os dentes, e até sobrancelha. Se o cabra tiver um beijo bom então, e um humor ácido tá armada a arapuca. É um tal de ‘deus me dibre, mas quem me dera’ que eu mesma não sei lidar.                 Desde a última vez que escorreguei na casca de banana do amor, e me espatifei no chão, com fraturas expostas múltiplas e traumatismo craniano,  estou  sendo mais cuidadosa, experimentando sorrisos  com dentes tortos,  até encavalados, como os do Anderson do Molejão - ou cérebros menos aguçados. Além, é claro, de evitar recaídas por contatinhos que eu tenho uma queda enorme – inteligentes e de sorriso bonito.                 Sinto-me a Mina Harker, com o Drácula de Bram Stoker – horroroso: vontade de dar e medo (leia-se: certeza) de doer. Esses meus dois gatilhos me matam, e fazem uma macumba mal chutada parecer Brad Pitt em Entrevista com o Vampiro.  Entrego-me e deixo que me mordam, me chupem... tirem de mim a energia vital. Mas acabou.                 Acredito que se um dia me relacionar de novo o meu objeto de desejo terá um sorriso bonito, e uma mente interessante. Mas não apenas: quero alguém tão plural quanto eu; aberto as novidades, as mudanças, as experiências. Apaixonado por animais. Respeitoso com os menos favorecidos. Tem que gostar de se enroscar comigo até se esquecer da hora. Tem que ser homem o suficiente para saber que vou voar, não para outros – não preciso disso, e que sempre vou voltar.                 Alguém para me conquistar terá que dar mais valor ao que não se pode comprar, que ao dinheiro; não pode se envergonhar de si mesmo, e nem de mim e minhas idiossincrasias. Se possível que até goste delas, como um dia eu estar vestida de mendigo e no outro de scarpin, e com os cabelos raspados.                 Tem que ser sincero, direto e livre de preconceitos retardados. Aceito quem seja intolerante a intolerância e ao Bostonaro.  Não precisa passar roupa, ter peças da moda, nem andar impecável... cheirosinho tá ótimo. Mas é bom que saiba que não sou mãe, nem dele, nem de ninguém com duas patas. Portanto, se não sabe, é bom que aprenda a cozinhar, lavar e o local de cada coisa – inclusive de suas mão, que espero estejam sempre pousadas nas minhas, com opção de estacionarem em minha cintura, ou um pouco acima, ou um pouco abaixo...                 Além de gostar de mim, que goste de meus amigos. Porque não os abandono por nada. Tenho certeza que esse Mané será muito querido por eles, que o receberão nessa trupe heterogênea de pessoas que não se adéquam muito.                 Por fim que consiga desfrutar da música tocada pelas melhores bandas, pelas buzinas dos carros no congestionamento; produzida pelas abelhas; que ouça enquanto eu canto meus mantras desafinados, dos quais não sei a letra. Que não saiba dançar se não gostar, mas que entre na roda comigo por achar um sacudido desajeitado ao lado de alguém legal vale mais que uma carranca no canto do salão.  

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